Não ter motivos para ficar é, na verdade, o primeiro motivo para ir embora.


Numa mente um tanto confusa e caótica quanto a minha, onde nem todos os dias são dias, uma mente que busca arduamente por respostas e a cada uma obtém o dobro das perguntas, eis que chegas tu, tu que és tão tu, tão dono de ti mesmo. Chegas com esse sorriso, esse maldito sorriso, e eu sei que serás um problema.

Permito-me envolver nas tuas dóceis palavras, permito-me deixar que os meus sentimentos tomem conta de mim, convenço-me de que sou especial, quando tu insistes em me mostrar o contrário. Transformas a minha vida numa montanha russa, chegas pronto a dilacerar-me dócilmente, como a suavidade de um furacão, sem te preocupares, em momento algum, com os danos que irás causar pelo caminho.

Questiono-me, por momentos, como me permiti abdicar dos meus princípios para me sujeitar a ser uma submissa tua?

Talvez a minha sanidade mental tenha atingido o prazo de validade. Talvez já não seja totalmente racional, ou talvez me tenha deixado encantar por ti, tal como os homens se permitiam com o canto das sereias.

Tento entender o porquê de não poderes ficar. Não havia eu, não havia tu, havia o nós. Onde foi que tudo isso se perdeu? Onde foi que nos perdemos? Teremos algum dia, na verdade, sido um do outro?

Colocas o casaco sobre o teu ombro, pegas no saco e caminhas até mim. Despedes-te com um beijo, sem nenhuma palavra. Partes sem nunca olhar para trás. Talvez tu saibas que olhar para trás implica deixar um pedaço de ti, e tu não te permitirias ser incompleto. Desejo, em silêncio, que fiques. Mas tu vais, sem arrependimento, sem dúvidas.

O amor é como um jardim. Não basta colocar sementes e esperar que elas cresçam sem que as reguemos, sem que cuidemos delas. Um jardim, mesmo depois de repleto de relva e algumas plantas, precisa de cuidado. Porque a qualquer momento surge uma erva daninha. E outra, e outra. E se não as tirarmos, elas acabam por se apoderar do terreno, a relva seca, as plantas morrem.

Devia ter-te avisado que não entendo nada de jardins. E devia ter percebido que as roupas na tua mala não seriam para muito tempo.

Não ter motivos para ficar é, na verdade, o primeiro motivo para ir embora.
E tu foste.

Comentários

  1. Se querias que a pessoa ficasse porque não o disseste? Porque nao verbalizaste aquilo que te passava pela mente? Dize-lo, expressa-lo, mostra-lo as vezes é mais do que motivo suficiente para a outra pessoa ficar. Pelo menos que o demonstrasses com esse olhar expressivamente gritante

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